5 de março de 2015

40 - COBRANÇA ESTÉTICA NA DANÇA por Paola Blanton

40 por Maria Badulaques - SEMANA 40

Quis terminar essa conversa com Paola com um tema que é muito importante pra mim e acredito que para muitas de nós: a imagem que queremos passar. 

Há uma cobrança da sociedade a cerca de nossa aparência, e quando se expõe num palco a coisa parece que ganhar contornos maiores.

Quantas vezes fui a apresentações e soube, depois, de comentários relacionados ao peso de fulana e a barriga de beltrana, nenhum sobre a dança. Isso se dá por diversos fatores, talvez a dança não tenha formado conexão e talvez a pessoa que fala sobre isso, não esteja aberta  a se conectar.


De uma forma ou de outra, acredito que nossa forma deve ser resolvida sem influencias externas, uma questão de bem-estar, nosso corpo, nosso templo, cuidar sim, entrar em surto psicótico, não!

Uma das coisas que me encanta no Tribal é que pouco se vê daquela beleza de bonequinha, é algo mais agressivo, a própria Carolena tem uma imagem impactante com aquelas tattoos, unhas gigantes e dreads. Odalisca? Uiiii, passa longe!!! Encanta-me esse empoderamento, esse se amar, por o barrigão pra fora e fazer ressoar com o Shimiie. 

Parafraseando a Mariah e Aerith do TribalCast Brasil.

EU NÃO DOU BARRACO... EU DOU SHIMIIE.

Bye-bye noia, tou pondo a barriga pra fora e indo ser feliz.

Acompanhe as palavras de Paola, pode fazer sentido pra você.



A Cobrança Estética na Dança

"Este assunto e algo muito próximo a meu coração por que revela uma dicotomia que eu vejo nos motivos das pessoas para entrar na arte da dança. 

Essa dicotomia se trata da diferença entre “estado de ser” e “estado de ser vista”. 

Eu posso dançar para mudar e evoluir meu estado de ser – de me focar, primeiro, em como eu me sinto, como eu realmente estou, e de fazer uma leitura honesta de meu corpo e sentimentos. Eu posso utilizar a dança como uma ferramenta de auto-conhecimento e a busca de uma autentica verdade interior. 

A partir dessa descoberta, eu posso dançar para transmitir e expressar a meu publico o resultado de minha jornada, tocando as cordas dos corações deles e nos unindo no reconhecimento arquetípico da grande jornada humana com todas suas dramas. Se minha dança despertou uma reação autentica no meu publico, o ciclo se completa e o impulso original da dança encontra seu fruto.  

Uma catarse acontece, capaz de ME curar e integrar e também de transmitir essa dinâmica a meu publico.

Isso e que compus o fundamento da dança como arte religiosa no antigo tempo dos Gregos. Justamente como o propósito do Teatro Grego era de produzir uma catarse moral – a dança, nos vários modos de sua pratica entre os Gregos, era ferramenta em direção a essa catarse. 

O motivo de minha dança pode ser a busca dessa verdade interior, capaz de revelar semelhanças ocultas entre minha verdade e as grandes verdades do Universo; uma verdade que abrange todos meus próximos e resulta em uma união de almas extáticas, curadas, e iluminadas.
O outro lado da dicotomia e o motivo de “dançar para ser vista”, e isso se trata de uma outra abordagem a arte da dança

Mais preocupada com formas, aparências, e orientações externas, essa dança a maioria das vezes é a dança que ganha mais aplauso, certificados cobiçados, competições, papeis na novela, capas de revista, DVDs, e muitos, muitos visualizações e olhares. Muitas vezes os olhares masculinos são motivados pelo desejo, e olhares femininos motivados pela inveja. 

Será que estou dizendo que é errado dançar para se aperfeiçoar e ganhar atenção? De jeito nenhum. Mas, para mim, é apenas metade da equação. 

Na minha opinião, a dança tem que gerar mais dança, tem que chamar, convidar, comunicar, e unir.  E não separar e alienar.

As cobranças de perfeição de técnica e estética não servem para unir ninguém quando ficam no primeiro plano da motivação a dança

Servem justamente para separar e elitizar, e geram um imperativo de satisfazer o olhar comercializado e padrões socialmente impostos que alimentam uma sexualidade retardada e mantenham a atual mulher – o ser humano - no segundo plano relativo a sua aparência física.

Tem muitas dançarinas e dançarinos que eu respeito por seu empenho, disciplina, técnica, leitura, coreografia, e forma. Mas muitos deles me deixam nada no coração – alem de pensar “wow, que técnica pura, que figurino bonito” vem nada do mistério humano que toca na minha alma. Em outras palavras, satisfez meu olhar, mas não alimentou minha alma, não alterou meu estado de ser.

Como a sagrada Isadora Duncan escreveu em seu livro A Arte Da Dança:

"Há três tipos de dançarinos: primeiro, aqueles que consideram a dança como uma espécie de ginástica, composta de arabescos impessoais e graciosos, em segundo lugar, aqueles que, ao concentrar suas mentes, levam o corpo ao ritmo de uma emoção desejada, expressando um sentimento ou experiência lembrada. E, finalmente, há aqueles que convertem o corpo em uma fluidez luminosa, entregando-o para a inspiração da alma."

E essa entrega, este dialogo entre corpo e alma, que anima meus estudos e pesquisas na arte da dança. Acho que colocar este motivo no primeiro plano vai naturalmente resultar em uma forma física mais nobre, linda, e autentica a MIM. Vai ser o resultado, não o motivo. Chamando a verdade da alma para o instrumento do corpo gera essa luminosidade fluida capaz de elevar a consciência de todos. 

Este é o elixir alquímico que a dança pode e deve procurar - além do ego, figurino, maquiagem, aplauso,  e palco. Além de musicalidade, coreografia e performatividade. Estes são todos ingredientes na mistura, mas o elixir vem do processo e a vivencia, os rituais e cerimônias da Dança do Futuro, a eventual mudança de atitude sobre a dança e realização de fins mais elevados para ela. 

Dançar pode-se tornar uma busca de iluminação.

E grande parte dessa iluminação flui de amor próprio e a auto-aceitação que eu acho essencial a dança despertar e fomentar em cada um. Senão, por que participar? Para me sentir menos e insuficiente? Para agonizar sobre uma gordurinha a mais, ou rugas, ou o fato de ser baixinha? Para me menosprezar por causa de ser “fora do padrão”? Mas, por onde então busco minhas referencias?  Será que existe algum padrão estético verdadeiro?

Para mim, estética e beleza não são as mesmas coisas. Justamente como “simetria” e “harmonia” também não são as mesmas coisas, como os Gregos demonstraram através da proporção áurea e como expressaram este princípio em suas obras de arte. A posição mais natural do corpo humano e aquele em harmonia com as forças da Natureza. 

Isadora Duncan, famosa por sua oposição a ballet, disse que o foco central do ballet era no desafio da força gravitacional da terra, e que isso era uma violação do primeiro principio de arte: que a arte devia reverenciar e interpretar a Musa primordial, a Natureza. Qualquer coisa que vai contra a Natureza e feia.

Inspirada neste principio, eu sinto que a dança deve servir no primeiro lugar como um modo de auto-conhecimento – algo que me leva a descoberta de minha verdade autentica, meu estado de Ser mais natural. 

Ela deve ser uma ferramenta que me leva a uma forma mais nobre de mim em todos os níveis – a  melhor e mais verdadeira saúde física, emocional, mental, e espiritual. Ela deve preparar meu corpo a receber e transmitir a mensagem de minha alma. E ela deve transmitir essa mensagem de forma poética a meu publico. O meu figurino acrescenta e ajuda nisso, mas de forma alguma e o principio que me guia.

Tem um ditado em inglês – “não coloca a carreta em frente do cavalo”, ou seja, o resultado em frente da motivação. Quando purificamos nossas motivações para dançar, nos vamos purificar nossos seres inteiros, e mesmo FORA de padrões estéticos socialmente impostos, nos vamos irradiar uma beleza que desafia palavras, por que surgiu de nossos Seres verdadeiros.

Eu sei que não e fácil. A sociedade é cruel, o olhar comercializado exerce muita pressão de se conformar. Mas eu sinceramente acho que estamos numa encruzilhada – uma forte mudança de paradigmas hoje em dia em que a oportunidade de utilizar a arte da dança como forma de integração pessoal esta se manifestando cada vez mais. 

Eu vejo isso nos olhares de minhas próximas nas danças circulares e também nas danças de palco e performance. 

Eu sinto isso no apertar das mãos e na corrente cardíaca que nos une. 

Cada vez mais vejo que o mais conectada que eu estou comigo mesmo, o mais conectada que estou com minhas próximas.  

Essa conexão e harmonia irradia a nossas comunidades e culturas e traz uma profunda oportunidade de dançar, como disse a grande Ruth St Denis “não para espantar e ganhar aplauso e sim para curar e abençoar.”

Este é meu sonho, a união extática de almas que flui naturalmente da união extática possível em cada um, entre corpo e alma.  

O figurino, as gordurinhas, as rugas, aplique de cabelo, maquiagem, o palco, e o aplauso são apenas notas de rodapé." (Paola Blanton)

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