15 de outubro de 2014

183 - YASMELA-SHELLEY MUZZY

183 por Carine Würch - SEMANA 20

Havia definitivamente a questão do figurino. Se você usasse o uniforme padrão: saia de três painéis, era provável que ninguém além da primeira ou segunda fila da platéia fosse capaz de ver o que você estava fazendo, pois a saia cobriria os pés e as taças. Também poderia prender e torcer, caso você dançasse ao redor. Nakish usava calças estilo gênio quando dançava, e não usava nenhuma saia sobre elas na maioria das vezes. Não gostava do look das calças tipo harem, dos anos 60, fiz um novo traje que não cobria as taças, quando dobrava os joelhos. Usava calças bem presas no tornozelo, aberta dos lados, mas ligado quadril ao joelho, do joelho até o tornozelo, por uma espécie de efeito  "mostra-esconde". 

Na parte de cima, usava um sutiã dança, e às vezes, por cima de tudo, uma túnica que ia até os joelhos, preso em torno do quadril com um cinto de moedas. Com este conjunto, ficava mais fácil para o público ver o que eu estava fazendo. Meus pés ainda eram visíveis, meu barriga estava visível, mas coberto, e a coisa toda tinha uma ar folclórico, mas ao mesmo tempo,  brilhoso.

No começo, usava 03 taças com uma boa espessura, não muito altas, mas resistentes. Para efeito de palco mais dramático, encontrei um algumas canecas de cerveja, pesadas e com hastes. 
Estas eram as taças industriais, que ficavam lindas do palco e deixavam-me um pouco mais alta do chão. Quando comecei a adicionar mais movimentos, Muzzy (Mustapha, o nosso mestre de cerimônias e músico) fez para mim, uma grande placa portátil, suave e lisa de um lado, e áspera do outro, para que pudesse mexer as taças, sem mexer a placa. A placa era armazenada facilmente em nosso ônibus e nunca mais tive que me preocupar em qual lado da superfície deveria dançar. Empacotamos um produto chamado "finger ease", juntamente com a nossa fita adesiva e kit de costura. Ele foi projetado para os pescoços das guitarras, e mantinha o teclado limpo. Alguns sprays disto em toda a minha placa de vidro e ela ficava lisa. Muzzy estava continuamente tentando colar coisas nas laterais das taças para que pudessem refletir as luzes, mas nada colava. 

Juntamente com o nosso número Calypso, houve reflexões sobre colocar luzes ao redor das taças, mas nada disso aconteceu, somente sonhos da estrada. Agora que penso sobre tudo isso, sei que somente fazemos qualquer coisa como esta, quando somos jovens, estúpidos e impermeáveis ao desastre.

Para o show, subia ao palco com 03 taças nas mãos, apresentando-as ao público, mantendo-as por cima da minha cabeça, fazendo alguns giros. Enquanto fazia tempo, um dos músicos trazia a minha placa com grande cerimônia e colocava na minha frente. Depois de cuidadosa (e dramaticamente) organizar as taças, levantava o pé, e subia em uma taça, e trazia o outro pé até as outras taças. Centrando-me para construir uma tensão dramática, passava por uma série de movimentos lentos, incluindo me ajoelhar até até o chão com um "Maya" e um lindo cambret com ¾ do corpo virado para o público. Como a placa era muito lisa, era capaz fazer círculos ao redor, mexendo as taças com os meus pés, e literalmente "dançar" sobre elas. Voltando-me para o público, agachava e pegava uma taça. Equilibrando-me nas duas taças restantes, levantava e segurava a taça no ar, levantando um pé. Assim me equilibrava sobre uma única taça, só por um momento, e era quando me sentia muito forte. É claro que o processo de repetição de substituir taças de sua posição original era tão angustiante quanto ficar sob uma só, mas a esta altura, sabia que a dança estava quase no fim, e a sensação de alívio que sentia me ajudava a terminar sem contratempos. Terminava a dança com shimmies, e saía de cima das taças, pegava cada uma e terminava com um giro. Uma variação dessa coreografia envolvia um layout com bellyrolls que requeriam mover as taças sob uma mão, com uma perna dobrada e uma perna estendida. Este layout fazia muita uma pressão sobre as taças, e também nos meus nervos, e eu não a fazia muitas vezes. Mas era bastante impressionante! 

Depois de alguns anos, passei a Dança com Taças para outra dançarina da trupe. Ela acrescentou novos elementos acrobáticos e de teatro para a peça. Sua estrutura leve era adequada para a delicadeza necessária nesta dança. Apesar da natureza robusta das taças pesadas ​​que usávamos, elas ainda eram de vidro e um tanto frágeis. Há um real de perigo na Dança com Taças. Quando decidi usar taças reforçadas, em vez de simples copos de água, comprei algumas belas taças mexicanas, sopradas. 

Durante uma apresentação, uma delas quebrou quando pisei em cima. Pulei antes que machucasse meu pé, mas sem antes de levar um grande susto. Depois disso, decidimos ir mais para a questão estrutural das taças e não a beleza, na hora da compra.


No primeiro ano do Bou-Saada, nosso grand-finale era a Dança com Taças. Quando passei-as adiante, não foi porque não gostasse delas, mas elas limitavam e exigiam muito. Não sendo particularmente atlética, tive dificuldade com os processos complexos envolvidos em fazer esta dança parecer interessante. 

As taças exigem paciência. No momento em que você se sente confortável com elas, você tem uma apreciação real do que está intrínseco no Taksim*
É comum para os novos dançarinos se apressarem na passagens do Taksim*, tentando passar por ele o mais rápido possível, porque não têm idéia do que a música está fazendo naquele momento. 

Nossa resposta para a improvisação durante a música do Oriente Médio, ilustra a profundidade de nossa compreensão da rica textura e dos nuances desta cultura. 

De volta a idade das trevas, Taksim* eram longas, arrastadas e às vezes cansativas, especialmente para dançarinos inexperientes, com pouco repertório, e, sem dúvida, para o público também. Você tem que cavar muito fundo para se manter conectado com o público e a banda. Às vezes me sentia como um elástico esticado ao limite, mas isto me ensinou a ouvir. Não ser capaz de mover seus pés, e ainda ter que dançar a música é uma grande disciplina. As Taças certamente me ajudaram a encontrar o meu centro, me abrandou e me fez pensar sobre a música, mas isto levou muitos anos.


* TaksimJá o taksim é caracterizado pelo som de um único instrumento como o violino, acordeon, flauta, alaúde, etc. Ocorre a improvisação no momento da música, ou seja, tudo ocorre instantaneamente, sem ensaios. Pode haver percussão para acompanhar o improviso e a dança exige movimentos mais lentos e tímidos da bailarina. Podem existir passagens de taksim em música clássica, ou apenas o próprio taksim como uma música inteira.



Texto original :

** Tradução livre - Carine Würch **

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